UMA
PERSPECTIVA INCLUSIVA DA AVALIAÇÃO
Thereza
Penna Firme[1].
“A
avaliação apreciativa propõe ver a realidade no seu lado mais promissor e, a
sombra dessa luz projetada, descobrir com competência e ética o que deve ser
corrigido e de fato corrigi-lo.”
Contam que o célebre autor de histórias
infantis Hans Christian Andersen, um pobre modesto e dedicado sapateiro de
Copenhague, na Dinamarca, em sua banca de trabalho, onde remendava e costurava
sapatos, costurava e remendava também a alegria e a emoção das crianças que por
ali passavam a caminho da escola, lá pelos idos do século XIX. Famoso pelos
seus contos de fada, Andersen foi, segundo estudiosos, “a primeira voz
autenticamente romântica a contar histórias para as crianças, e buscava sempre
passar padrões de comportamento que deveriam ser adotados pela nova sociedade
que se organizava, inclusive apontando os confrontos entre ‘poderosos’ e
‘desprotegidos’, ‘fortes’ e ‘fracos’, ‘exploradores’ e ‘explorados’. Andersen
também pretendia demonstrar a ideia de que todos os homens deveriam ter
direitos iguais” (Wikipédia).
Um dia, Andersen decidiu caminhar até a
escola para onde aquelas crianças corriam depois de passar momentos fascinantes
junto a ele, de quem possivelmente não desejariam se afastar jamais. Foi então
que ele viu indignado, na saída da escola, a cena humilhante de um menino
“feinho” tal como era ali percebido, ser agredido, empurrado e xingado pelos
outros meninos, sem que qualquer iniciativa de proteção dos adultos fosse
tomada. Hans puxou-o para perto dele e ali mesmo, sentado no muro da escola,
contou-lhe a história que acabava de inventar especialmente para o “menino
feinho”: O Patinho Feio, que não é preciso contar aqui porque tantas vezes
contamos essa história às nossas crianças.
O menino parou de chorar, foi feliz para
casa, contou o ocorrido para o pai, que imediatamente procurou o extraordinário
“psicólogo sapateiro” ou talvez “filósofo” ou, por certo “educador” para
agradecer-lhe a transformação de seu menino, ontem patinho feio, hoje cisne de rara
beleza! Andersen tinha costurado a autoestima de seu filho. Esse pai era editor
de histórias infantis e levou toda a obra rascunhada de Andersen para
publicá-la. Foi assim que nasceu o que hoje temos o privilégio de conhecer:
essa literatura de sabedoria e criatividade que já atravessa séculos.
Estudos sobre autoestima (Sears e Sherman,
1964; Penna Firme, 1969) e a experiência profissional têm destacado o papel
crucial dessa apreciação do autoconceito no ajustamento pessoal e no
desenvolvimento harmonioso dos grupos humanos e das organizações, enfatizando
que autoestima está relacionada com autoconfiança e tolerância à autocrítica e
à frustração. O aumento da autoestima eleva o nível de aprendizagem e de
competência profissional. Ao contrário, as pessoas tendem a não atuar bem
quando se espera menos delas. É necessário, portando, descobrir meios efetivos
de elevar a autoestima dos alunos, de outros atores envolvidos no processo
educativo e das organizações simultaneamente, tornando públicos os sucessos
alcançados, o que, por certo, resultará em contínuo aperfeiçoamento. Além
disso, quanto mais elevada for a autoestima de um indivíduo, mais positivos
serão seus sentimentos em relação a outros indivíduos e mais positivamente ele
será capaz de perceber os sentimentos de outros
a seu respeito.
Em síntese, a avaliação apreciativa, nesse
contexto tradicional e conservador da avaliação é um desafio. (...) Não se deve
culpar a vítima, mas indagar por que e como o sistema escolar está fracassando
com nossas crianças, em vez de por que e como essas crianças, estão
fracassando. O papel do avaliador é buscar corrigir os fatores que sustentam a
injustiça social, descobrindo os elementos que contribuem para os problemas
sociais e solução. Nesse sentido é necessário desfazer o nó, ou seja, o
bloqueio da decepção e desesperança e abrir caminhos desobstruídos de
crescimento individual e social. Para isso, precisamos abraçar o “patinho feio”
e, juntos com ele, descobrir o cisne deslumbrante que está dentro dele. É preciso
levar conosco o que foi deixado de lado, excluído, abandonado e resgatá-lo. É
necessário incluir, apreciar e, sobretudo, amar antes de ensinar. Avaliação é
isso.
Fonte:
Texto retirado da Revista Pátio. Artmed – Ano XIII – maio/julho 2009. P. 44 - 47.
[1] Doutora (Ph. D) em Educação e em
Psicologia da Criança e do Adolescente, consultora em Avaliação, professora
aposentada da UFRJ e coordenadora do centro de Avaliação, da Fundação
Cesgranrio.
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